Veja os pagamentos aos conselheiros dos Tribunais de Contas Estaduais - Don't LAI to Me #137
Levantamento inédito detecta ainda falhas na transparência dos dados – 14 dificultam a coleta das informações em formato aberto; confira os dados
Esta é a edição #137 da Don’t LAI to me, a newsletter da Fiquem Sabendo para quem quer informação direto da fonte. Todo o conteúdo é produzido com base na Lei de Acesso à Informação (LAI). Entenda tudo sobre a legislação na nossa WikiLAI!
🟨 Valores brutos de folhas de pagamento de conselheiros de 12 TCEs analisadas pela FS chegam R$ 69 mi em 2024
A transparência continua a meio mastro na maioria dos tribunais de contas estaduais quando se trata da folha de pagamento de seus conselheiros. Dos 27 tribunais, 14 não divulgam seus dados de remuneração de forma integralmente acessível e aberta ao público. Outros 13 tribunais oferecem coletas de informações com restrições menores – permitindo o download de maior volume de dados, na maioria das vezes, em formato aberto. Essa é uma das revelações de um levantamento inédito feito pela Fiquem Sabendo (FS) em novembro sobre os vencimentos daqueles que fiscalizam a gestão financeira e orçamentária dos recursos públicos de estados e municípios. A investigação revela ainda, de forma organizada, os vencimentos líquidos mensais de 127 conselheiros de 13 estados.
O trabalho conduzido ao longo de novembro pela Fiquem Sabendo detectou que mais da metade dos tribunais de contas das unidades federativas dificultam a extração de dados sobre salários de conselheiros. Os obstáculos incluem a exigência de informações adicionais dos requerentes, entrega de dados em formatos não abertos, como PDF, ou a permissão apenas para consultas específicas — mês a mês, por exemplo —, em desalinho com o espírito da Lei de Acesso à Informação (LAI).
O levantamento conduzido por João Vitor Zaidan, da equipe de Advocacy da Fiquem Sabendo, e por Igor Laltuf, cientista de dados da organização e responsável pelo tratamento e análise das informações, apurou que a busca e, principalmente, a coleta de informações são dificultadas em 14 unidades federativas: Amapá, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Paraná, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia e Sergipe.
“É completamente absurdo que, em 2024, ainda exista dificuldade para acessar informações sobre a remuneração de servidores públicos. É ainda mais inacreditável quando estamos falando de órgãos controladores, cuja função é justamente fiscalizar a transparência, a prestação de contas e o uso dos recursos dos demais órgãos. Então, que exemplo isso dá? Para além do problema interno no órgão, isso se espalha para o restante da administração pública”, avalia Maria Vitória Ramos, diretora-executiva e cofundadora da Fiquem Sabendo.
Mais acessíveis, mas não muito
Outros 13 tribunais de contas – dos estados de Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Goiás, Minas Gerais, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Roraima, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins – são mais acessíveis, mas também apresentam limitações. As duas principais dificuldades identificadas são: (1) o fato de que cada tribunal lista os componentes da remuneração dos conselheiros de maneira diferente e (2) a ausência, em alguns tribunais, de um dicionário de variáveis que permita identificar claramente cada item da folha de pagamento. Dessa forma, torna-se praticamente impossível para o cidadão obter os valores brutos recebidos por cada conselheiro com precisão, sem risco de cometer erros. E, em alguns casos, como no tribunal catarinense, os salários brutos do conselho não estão disponíveis para download de forma agrupada, exigindo busca individualizada por nome de cada membro — apenas os pagamentos líquidos podem ser acessados e baixados dessa forma.
“A equipe da Fiquem Sabendo, que trabalha com isso e é especializada nesse tipo de fiscalização, enfrenta dificuldade para obter e entender esses dados, porque eles são muito mal explicados, além de haver problemas no funcionamento dos próprios portais. Agora, imagine um cidadão que não tem esse preparo nem o tempo disponível para isso e quer fiscalizar e acompanhar ativamente o seu estado ou município. Como ele consegue fazer isso?”, questiona a diretora Maria Vitória.
Pagamentos brutos e líquidos
Apesar das limitações impostas por boa parte dos portais, reunimos dados dos 12 tribunais de contas estaduais — Alagoas, Amazonas, Bahia, Goiás, Minas Gerais, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Roraima, São Paulo e Tocantins — com informações sobre componentes que pudessem ser associados ao valor bruto de remuneração. Nessa estratégia, componentes da folha de pagamento, como “total de vencimentos”, foram classificados como valores brutos da remuneração. Mesmo sem identificadores claros ou dicionários detalhados, a Fiquem Sabendo conseguiu obter números aproximados, ainda assim suficientes para dimensionar o tamanho do problema.
Neste ano, entre janeiro e outubro, o grupo de 12 tribunais de contas estaduais analisados soma R$ 69,4 milhões em valores brutos para 120 conselheiros.
A pouca transparência sobre os componentes da folha de pagamento em alguns tribunais de contas estaduais (TCEs), que compromete análises mais detalhadas, levou nossa equipe a optar editorialmente pela disponibilização apenas dos dados referentes aos valores líquidos pagos a 127 membros de 13 tribunais de contas (AL, AM, BA, GO, MG, PA, PE, RJ, RR, SC, SP e TO).
O arquivo inclui os pagamentos líquidos mensais de conselheiros — incluindo substitutos — entre janeiro e outubro deste ano. A planilha fornece ainda informações claras sobre a disponibilidade dos dados coletados nos sites dos tribunais de contas, a metodologia de análise utilizada pela Fiquem Sabendo, além do pagamento líquido médio de cada conselheiro no período e o pagamento líquido médio por órgão.
Neste ano, como é possível conferir no arquivo que liberamos, o pagamento líquido total desse grupo de 127 conselheiros chegou a R$ 54 milhões. A cifra foi impulsionada, em boa parte, pelos valores pagos a integrantes dos TCEs de Roraima e Pernambuco, como demonstrado no gráfico abaixo.
Acesse os dados
A planilha com o compilado dos pagamentos líquidos aos 13 tribunais que disponilibilizam a informação pode ser acessada aqui;
Dados por estado: a pasta com a íntegra dos dados de baixados dos portais de transparência dos tribunais de cada estado está aqui.
Assunto pautou coluna de fundadores da FS
O tema desta newsletter foi tratado recentemente na coluna Transparência Pública, assinada por Maria Vitória e Bruno Morassutti, diretor de Advocacy e cofundador da Fiquem Sabendo, publicada na Folha de S.Paulo na quinta-feira (14). A dupla discutiu os alarmantes pagamentos de R$ 7,7 milhões aos sete conselheiros do TCE-RR em setembro noticiados dias antes na imprensa nacional. O montante, lembram os colunistas, seria suficiente para remunerar 1.263 professores e expõe não apenas a disparidade salarial, mas também a falta de transparência em muitos tribunais de contas, órgãos que deveriam servir de modelo para a administração pública.
O texto também enfatiza que os pagamentos milionários foram justificados pelo TCE-RR como indenizações por trabalho acumulado e abonos atrasados, mas sem detalhamento claro das rubricas. Além disso, a coluna aponta para uma distorção estrutural: os conselheiros têm uma carga horária semanal de apenas 30 horas, o que torna insustentáveis os argumentos de excesso de trabalho. Especialistas ouvidos, como Carlos Ari Sundfeld, da FGV, consideram o modelo “inconstitucional, uma aberração administrativa”. Para Bruno Carazza, da Fundação Dom Cabral, a dificuldade de fiscalização incentiva a insatisfação pública e o descrédito nas instituições.
A coluna critica o desrespeito ao teto remuneratório constitucional e a opacidade na divulgação de dados, que muitas vezes apresentam valores agregados como "proventos diversos", impossibilitando a conferência pela sociedade. Nesse sentido, a avaliação dos cofundadores da FS que assinam o texto é de que o caso do TCE-RR é emblemático de um sistema onde os próprios beneficiários têm poder para autorizar pagamentos retroativos e milionários. “Quem controla os controladores?”, questionam. Você pode conferir a íntegra da coluna clicando no banner abaixo.
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🟨 Estudo publicado pelo Instituto Alana revela desigualdades no acesso ao verde nas escolas das capitais brasileiras; FS atuou na assessoria técnica
Divulgado na última semana, o estudo O acesso ao verde e a resiliência climática nas escolas das capitais brasileiras revelou que mais de 1/3 das escolas das capitais do país não possuem áreas verdes em seus terrenos (37,4%). Conduzido pelo Instituto Alana em parceria com o MapBiomas e assessoria técnica da Fiquem Sabendo, o levantamento aponta que a ausência de vegetação atinge 43,5% das unidades de educação infantil, expondo desigualdades no acesso à natureza e maior vulnerabilidade climática de comunidades de baixa renda.
A análise abrangeu 20.635 escolas de educação infantil e ensino fundamental das capitais brasileiras, considerando vegetação nos terrenos escolares, proximidade de praças e parques, localização em ilhas de calor e áreas de risco climático. Entre os dados, destacam-se que 52,4% das escolas situadas em favelas não possuem áreas verdes e que 370,5 mil estudantes estão em unidades localizadas em áreas suscetíveis a enchentes e deslizamentos.
Os resultados também evidenciam o impacto do racismo ambiental, uma vez que escolas com maior proporção de alunos negros enfrentam mais desafios relacionados à falta de áreas verdes e ao calor extremo. Salvador (BA) lidera o ranking das capitais com maior percentual de escolas sem vegetação – com 87% das unidades escolares sem vegetação em seus lotes –, enquanto Boa Vista (RR) apresenta a menor proporção de escolas sem área verde, com apenas 5%.
O relatório apresenta recomendações como a remoção do concreto de espaços abertos para criar novas áreas verdes, com prioridade para espécies nativas, o fomento ao plantio e manejo de hortas, jardins e miniflorestas com a participação dos estudantes, a criação de pátios escolares naturalizados integrados ao sistema municipal de áreas verdes e a priorização dessas intervenções em escolas e territórios com menor cobertura verde e maior vulnerabilidade socioeconômica e ambiental. As iniciativas visam não apenas reduzir as desigualdades, mas fortalecer a resiliência climática e garantir o desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes.
Acesse o relatório completo aqui.
🟨 CGU reconhece necessidade de divulgação de agenda oficial de Janja quando ela representa o Estado brasileiro
Provocada por um recurso administrativo da Fiquem Sabendo, a Controladoria-Geral da União (CGU) reconheceu que agendas de atividades realizadas por pessoas que, mesmo não sendo servidores públicos, representam oficialmente o Estado devem ser disponibilizadas. O caso envolveu um pedido de acesso à agenda da primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, com base na transparência pública prevista na Lei de Acesso à Informação (LAI).
Apesar de reafirmar que a primeira-dama não ocupa cargo público e, portanto, não está submetida às obrigações de divulgação rotineira de compromissos, a CGU reconheceu que eventos relacionados a funções oficiais de representação exigem publicidade. Um exemplo prático foi a viagem aos Jogos Olímpicos de Paris em 2024, em que Janja integrou a comitiva oficial brasileira. Nesse caso, questionada pela CGU, a Casa Civil forneceu detalhes da agenda pública, que incluía reuniões com autoridades internacionais e eventos relacionados à delegação brasileira.
"A decisão é relevante porque reconhece o direito de sobrestar informações de agentes que representem o Estado brasileiro, ou mesmo a União, independentemente de terem um cargo ou função pública”, explica Bruno Morassutti, diretor de Advocacy e cofundador da Fiquem Sabendo.
O parecer que subsidiou a decisão da CGU, publicada na quinta-feira (21), ressalta que, embora a primeira-dama não seja formalmente um agente público, o princípio da transparência deve prevalecer em situações em que ela atua em nome do Estado, como em compromissos oficiais. Esse entendimento pode impactar pedidos futuros, reforçando a necessidade de clareza sobre o papel de figuras públicas em contextos institucionais.
“Nem sempre a gente vai ter pessoas com vínculo direto com a administração pública representando o governo federal, a União ou, enfim, a administração de modo geral. Nesse caso, a gente reconheceu isso com relação à primeira-dama, o que é um avanço, mas, eventualmente, podem existir outras pessoas que estejam representando o Estado brasileiro, especialmente em compromissos internacionais", explica Bruno.
Apesar da vitória, a Fiquem Sabendo recorreu da decisão à Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) por entender que a primeira-dama representou o Estado brasileiro em outras oportunidades desde 2023, além de sua participação na comitiva que viajou a Paris, como indicou a Casa Civil ao ser questionada pela CGU.
A decisão pode ser acessada aqui.
🟨 E mais…
Relatório Focus: Solicitamos informações ao Banco Central sobre o Relatório Focus, documento essencial para consolidar projeções econômicas no Brasil. Entre os pontos requisitados, destacam-se o histórico de atualizações do Sistema Expectativas de Mercado, as respostas às sugestões feitas por instituições participantes em 2018 e os critérios para cadastro de participantes, como instituições financeiras, consultorias econômicas e outros agentes de mercado. Os dados podem ser acessados aqui.
Esta newsletter foi produzida por Francisco Amorim, com levantamento de Igor Laltuf e João Vitor Zaidan e edição de Taís Seibt.
⬛ Sobre a Fiquem Sabendo
A Fiquem Sabendo é uma agência de dados independente e especializada na Lei de Acesso à Informação (LAI). Trabalhamos para reduzir o desequilíbrio de poder entre a Sociedade e o Estado. Disponibilizamos ferramentas para que os cidadãos questionem seus líderes, defendam políticas baseadas em evidências e participem ativamente da democracia. Conheça nosso trabalho.
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Associação Fiquem Sabendo
Direção Executiva: Maria Vitória Ramos | Direção de Estratégia: Taís Seibt | Diretor de Advocacy: Bruno Schmitt Morassutti | Diretor de Tecnologia: Vitor Baptista